sexta-feira, 1 de julho de 2011

Caio F. ( para ler ao som de London London)




"Sem data

Claro, o dia de amanhã cuidará do dia de amanhã e tudo chegará no tempo exato. Mas e o dia de hoje?
Só quero ir indo junto com as coisas, ir sendo junto com elas, ao mesmo tempo, até um lugar que não sei onde fica, e que você até pode chamar de morte, mas eu chamo apenas de porto.

2 de março

Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Meu coração sangra com uma dor que não consigo comunicar a ninguém, recuso todos os toq
ues e .ignoro todas as tentativas de aproximação. Tenho vontade de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela, como um cão com seu osso.
A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única magia que existe é a nossa incompreensão".
[ Caio Fernando Abreu ]



Trecho do conto Lixo e Purpurina do livro Ovelhas Negras. O conto é uma espécie de diário literário da estadia do autor em Londres. Um conto fragmentado onde a unidade maior é do sentimento interior de inadequação, do sentimento de eterno estrangeiro
.


Música: London London/Interprete: Cibelle
Download:

Nenhum comentário:

Postar um comentário